A Carolina
Querida, ao
pé do leito derradeiro
Em que
descansas dessa longa vida,
Aqui venho e
virei, pobre querida,
Trazer-te o
coração do companheiro.
Pulsa-lhe
aquele afeto verdadeiro
Que, a
despeito de toda humana lida,
Fez a nossa
existência apetecida
E num recanto
pôs um mundo inteiro.
Trago-te flores, - restos arrancados
Da terra que nos viu passar unidos
E ora mortos nos deixa separados.
Que eu, se
tenho nos olhos malferidos
Pensamentos
de vida formulados,
São
pensamentos idos e vividos.
Machado de Assis.
Reflexão
O
eu lírico inicia o soneto construindo uma cena, o túmulo de sua amada. Ele
descreve a morte como um descanso. No terceiro verso, da primeira estrofe o eu
lírico faz um jogo com o presente e futuro, quando ele escreve “Aqui venho e
virei,...” percebemos que há uma relação entre a vida e a morte, “Aqui venho”,
ou seja, Aqui estou vivo, porém “virei”, o eu lírico não se conforma com a
separação que a morte trouxera para ele e sua amada, percebemos a partir disto
um paralelo entre o soneto e a vida de Machado, analisando alguns dados
bibliográficos percebemos que Machado também passa pelo mesmo dilema do eu
lírico, este soneto foi publicado em 1906, é interessante percebermos que em
1904 morre a esposa de Machado, dois anos após a morte de Carolina(esposa de
Machado) ele publica este soneto, e quatro anos após a morte da amada e dois
anos pós o soneto Machado morre, ainda em vida Machado deixa uma determinação, que em sua morte ele deveria ser enterrado no
mesmo túmulo de Carolina sua amada esposa. No verso citado no início do
paragrafo, que foi escrito dois anos após a morte dela (Carolina) e dois anos
antes a sua morte, o eu lírico deixa vestígios deste desejo de Machado.
Todo
o soneto é embebecido de sentimentalismo, na segunda estrofe do soneto o eu
lírico descreve o desejo de que ele e sua amada estivessem juntos, também
escreve que o seu mundo, sua vida está “num recanto”, em um túmulo.
Na
terceira estrofe o eu lírico constrói uma cena com a ação de levar flores ao túmulo, em seguida descreve como lembranças a sua relação de união e
companheirismo com a amada. No ultimo verso da terceira estrofe, percebe-se que
o eu lírico mesmo em vida se considerava morto após a morte de sua amada, e
também expõem sua inconformidade de estar em uma condição diferente dela,
ocasionando a separação entre ambos.
Nos
dois últimos versos da quarta estrofe, o eu lírico expõem sua gratidão por sua
amada, escrevendo “Pensamentos de vida formulados”- os pensamentos,
conhecimentos que ele adquiriu (formulou) são graças a ela, “São pensamentos
idos e vividos”, pensamentos idos e vividos esses, que foram passados da amada
para o eu lírico.
Carolina
Augusta Xavier de Novais era de origem portuguesa e muito culta, veio para o
Brasil após a morte de sua mãe em 1866, um tempo depois seu irmão Faustino
Xavier, amigo de Machado, adoeceu com problemas mentais, e em uma das visitas
de Machado a seu amigo Faustino, conhece Carolina, o tempo passa, Machado e
Carolina ficam noivos. Em 16 de agosto de 1869 Faustino Xavier de Novais morre,
três meses após a morte de seu irmão Carolina se casa com Machado, em 12 de
novembro de 1869. Após seu casamento com Machado, Carolina lhe apresenta a literatura
alemã e inglesa, reformulando o estilo literário de Machado.
Neste
soneto “A Carolina” Machado deixa vestígios através do eu lírico sua
imensurável gratidão por tudo que Carolina foi para ele de maneira simples e
singular.
“A
literatura é, assim, a vida, parte da vida, não se admitindo que possa haver
conflito entre uma e outra. Através das obras literárias, tomamos contato com a
vida, nas suas verdades eternas, comuns a todos os homens e lugares, porque são
as verdades da mesma condição humana." (COUTINHO,
Afrânio. Notas de teoria literária. Rio de Janeiro: Vozes, 2008.)
Considerando
o soneto, a reflexão e o trecho retirado do livro “Notas de teoria literária” de
Afrânio Coutinho, responda. Qual o limite entre a vida e a literatura?
Obs.:
Sua participação é de extrema importância para nós, por isso, não deixe de
postar abaixo sua opinião ou comentário.
Grata, Fernanda Machado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário