Corrupção
política ou verdade humana?
Este
conto foi publicado na coletânea Papéis Avulsos,datada de 1882,intitulado “A
Sereníssima República”,notoriamente trata-se de uma crítica aos processos
eleitorais e a corrupção,não apenas da
época em questão,mas também da nossa atualidade.Dessa forma,podemos elucidar a
contemporaneidade das obras machadianas,pois há um certo discurso dialético
entre passado,presente e futuro.
Agora,de
acordo com o novo conceito de interpretação,legitimado pelo círculo
hermenêutico gadameriano,que prestigia a leitura do todo pelas partes e das
partes pelo todo e que também reforça a intenção do desvelamento,ou seja,ler o
que não está explicitamente escrito,podemos perceber que as críticas aos
processos eleitorais tornam-se meros planos de fundo para o que de fato quer
ser revelado,não apenas neste conto,mas em toda extensão da obra do autor de “O
Alienista”.Na realidade é mais que uma crítica irônica e realista da
sociedade,é um despertar para o mistério essencial que habita o ser humano e
que responde pela motivação de muitos de seus atos.Isto posto,mais uma vez
encontramos nos contos de Machado de Assis, o “humanitismo borbista”,criado no
romance Memórias Póstumas de Brás Cubas e melhor articulado em Quincas Borba.O
humanitismo nada mais é do que as atitudes humanas sendo motivadas pelas
próprias vontades,o instinto de sobrevivência a qualquer custo,a destruição da
vida alheia e á própria.
O
conto tem início com o narrador chamando atenção para uma descoberta brasileira
muito mais importante do que uma outra que havia sido publicada pelo jornal O
Globo.Há quem diga que tal publicação nunca existiu,então pode se tratar de uma
crítica ao O Globo se levarmos em consideração,o questionamento que
Machado,através de seu narrador,fez em relação ao materialismo científico em
voga na época,que era tão prestigiado pelo jornal,isto pode ser observado quando
o Cônego Vargas afirma ter embasado sua descoberta em uma citação de Darwin e
Buchner “Citando Darwin e Büchner, é
claro que me restrinjo à homenagem cabida a dois sábios de primeira ordem, sem
de nenhum modo absolver (e as minhas vestes o proclamam) as teorias gratuitas e
errôneas do materialismo.”
O
narrador afirma ter encontrado uma espécie de aranha que fala e ter criado uma
sociedade chamada de Sereníssima República.Através do recurso estilístico
chamado metáfora,Machado associa as aranhas às pessoas,a própria
humanidade,desta forma ,faz outra crítica quando o cônego afirma “A aranha, senhores, não nos aflige nem
defrauda; apanha as moscas, nossas inimigas, fia, tece, trabalha e morre. Que
melhor exemplo de paciência, de ordem, de previsão, de respeito e de
humanidade?”
Durante
a narrativa,Vargas determina um governo político para as aranhas,impõe então um
sistema semelhante a República da antiga Veneza em que as eleições eram feiras
a partir da retirada de bolas contendo os nomes dos candidatos de dentro de um
saco,as próprias aranhas deveriam tecer
e formar o saco,com sucessivos experimentos o narrador tentou dar ordem
social as aranhas,mas não teve sucesso,pois o sistema foi sendo adaptado e
fraudado pelas próprias
aranhas ,que buscaram seus próprios interesses,o sistema corrigiu-se e
variou-se por diversas vezes e modos,sempre corrupto e falho.
O
conto acaba mostrando que as próprias aranhas eram as responsáveis e produtoras
do problema e que esta situação nunca terá um fim.Da mesma forma ocorre com a
humanidade,somos todos da mesma espécie,dominados pelo autoritarismo social e
político e ainda assim não deixamos de propiciar e legitimar a opressão de que
somos vítimas.
Como
podemos ver,se trata bem mais do que uma crítica as corrupções políticas e
diferenças sociais,é na verdade um alerta ao leitor,uma tentativa de desvelar o
modo pelo qual esses males se fundem ao cotidiano da relações humanas.
Por:SUZANA
CORREIA LEMOS
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